Sempre que transitamos nas conturbadas estradas da predestinação, nossos opositores, no sentido doutrinário, levantam a questão de Judas, o Iscariotes, afirmando que enquanto não havia traído o Mestre, era um salvo, já que andava entre eles, falava como eles, pregava como eles, e o próprio Cristo o escolhera para ser um de seus apóstolos.
Eu sei que é difícil aceitar aquilo que muitas vezes se coloca de forma clara diante de nossos olhos, devido aos nossos amados pressupostos. Lutei e ainda luto para vencer alguns que insistem em permanecer, mas prossigo conhecendo ao Senhor, moldando minha mente à Palavra. Algumas vezes me deparo com minhas limitações, e peço a Deus que me ilumine, e quase sempre Ele atende, algumas vezes me deixa de molho por um tempo, outras não se dá ao trabalho de responder.
Mas o caso de Judas é emblemático, pois aqueles que não acreditam que Deus possa reprovar alguém, condenar sem dar sequer uma chance, não aceitam que Judas tenha sido escolhido exatamente para fazer o que fez, ou seja, trair a Cristo. Alguns, inconsistentemente, afirmam que qualquer um dos discípulos poderia ter feito o mesmo.
Eu até poderia afirmar que qualquer um dos discipulos poderia ter sido o traidor, se eu não tivesse a Bíblia em mãos e se isso, a traição, ainda estivesse por acontecer. Realmente eu não sei o que acontecerá daqui a alguns segundos, que dirá dias ou anos, mas o que aconteceu e está registrado eu sei, e o que eu sei é que Judas foi o traidor porque estava destinado a isso. Inclusive, nossos opositores negam o seu próprio ensino sobre a presciência divina, ao defender a idéia de que o traidor poderia ter sido Pedro, por exemplo.
A Escritura é clara quanto a isso, Judas nunca foi um dos que teve seu nome escrito no livro da vida. Vamos ver como a Bíblia trata Judas.
Ladrão (João 12:6), e se Paulo, anos depois, ensinava que os ladrões não herdam o Reino dos Céus, 1 Co 6:10-11, quanto mais Cristo;
Um diabo (João 6:70), se o caso fosse de possessão demoníaca, Jesus poderia muito bem expulsar o “encosto” e Judas “tão bonzinho que era”, deixaria de roubar da bolsa, e jamais teria traído Jesus.
Haviam profecias de que o Messias haveria de ser traído, isso é ponto pacífico. Se haveria o ato, também devia haver o agente executor desse ato. Dizer que Deus deixou isso aberto no tempo é tolice. Na verdade, para demonstrar que Judas foi escolhido por Cristo para isso mesmo, bastaria ler os versos finais do capítulo 6 de João, onde Cristo diz “Não vos escolhi a vós os doze? e um de vós é um diabo.”. Cristo diz que Judas “é um diabo”, não que Judas se tornaria um após Satanás entrar nele como escreve Lucas, ou ter dado lugar como escreve o próprio João. Judas ERA um diabo.
Ainda no capítulo 6, mas agora nos vs.64-65, e fazendo uma montagem da fala de Cristo, retirando os comentários joaninos do meio da fala, e colocando-os no final, fica até mais fácil compreender: “Mas há alguns de vós que não crêem.[…] Por isso eu vos disse que ninguém pode vir a mim, se por meu Pai não lhe for concedido, porque bem sabia Jesus, desde o princípio, quem eram os que não criam, e quem era o que o havia de entregar.”. João afirma que “desde o princípio” Cristo sabia que havia descrentes entre os discípulos, bem como também sabia quem seria o traidor, apenas os apóstolos estavam alheios a esse fato, afinal eram simples humanos limitados no tempo e no espaço, e se Cristo desde o princípio sabia quem seria o traidor, não havia a possibilidade de algum dos outros discípulos passarem na frente de Judas.
Judas estava no lugar errado, como bem nos ensina Pedro após a ascensão de Cristo. Ele diz em Atos 1:25 que Judas se desviou do caminho de Deus para ir para O SEU PRÓPRIO CAMINHO. Judas apenas seguiu seu destino.
Agora, se formos buscar oportunidades de salvação no sentido que os nossos opositores usam, Judas teve todas, ele ouviu a Palavra da boca daquele que é a Palavra, ele teve oportunidade de pregar o Evangelho, ele curou enfermos, mas a despeito de ter visto e ouvido tudo isto, o discurso de Cristo era, e ainda é, “duro” de engolir. O próprio Jesus nos adverte acerca deste tipo de pessoa em Mateus 7:21-23, onde Ele afirma que não é porque alguém diz que Jesus é Senhor de sua vida, ou porque opera sinais e maravilhas, mas continua mantendo atitudes iníquas, que está salvo. Estes não são frutos da salvação, o fruto da salvação é uma nova natureza que tem prazer em fazer a vontade do Pai. E Judas não tinha isso, apesar dos sermões de Cristo, continuava roubando, apesar dos dons de operar maravilhas, continuava sendo “um diabo”. Sendo assim, ao trair Cristo, ele estava apenas seguindo o seu próprio caminho.
Se os nossos opositores estivessem corretos, Deus não poderia condenar nenhuma das pessoas que não tiveram a “oportunidade” de ouvir o Evangelho, pois, segundo eles, seria injusto condenar sem dar a chance. Como diria o Pr. Renato Vargens, vamos combinar uma coisa, em nenhum lugar da Bíblia há este tipo de ensino, são simplesmente sofismas humanos aplicados na interpretação bíblica, ou seja, não tem nenhum valor.
Concluindo, afirmar que qualquer outro discípulo poderia ter sido o traidor, para aqueles que advogam a eleição presciente, é atirar no próprio pé. No fim das contas, a única posição que realmente podemos seguir é a de que, apesar de ter caminhado entre os salvos por mais de três anos, Judas nunca foi um deles, ele sempre foi o filho da perdição, nascido para cumprir o propósito de trair o Messias.
Fonte: Divinitatis Doctor