Ensinar a Bíblia… é com muito pesar que escrevo isso: a Escola Bíblica se tornou um ministério fora de moda na igreja em nossos dias. Infelizmente vivemos o tempo do “oba-oba” nas igrejas evangélicas. Muita emoção, pouco compromisso (genuíno) com Deus. As igrejas parecem restaurantes espirituais, onde é posto um menu e o crente freguês consome apenas a mercadoria que lhe apraz. Cultos mecânicos dirigidos por ministros de plástico programados para falar, pular, berrar e agir de modo que agrade sua platéia, ávida por ouvir “pregação” que traga uma mensagem antropocêntrica geralmente relacionada a uma vida de prosperidade material ou coisas do gênero.
O retrato de uma igreja que abandonou o ministério de ensino bíblico é lastimável. Conforme as palavras de R.N. Champlin, tal igreja se torna “infantil, carnal, com disputas e cisões na igreja local. Um povo faminto espiritualmente, será um povo infeliz. A ausência de ensino cristão arma o palco para apostasia”. [1] Você já presenciou esta realidade triste? Eu posso falar sobre isso com propriedade.
É evidente que os cristãos não são enciclopédias ambulantes com capacidade de armazenar todos textos bíblicos de Gênesis a Apocalipse, mas existem informações muito básicas (que refletem nossa qualidade espiritual) que precisam e devem ser armazenadas, ou melhor, aprendidas.
Certa vez, perguntei para uma pessoa que freqüenta uma igreja evangélica há dez anos, sobre o livro de Tobias (texto apócrifo constante apenas nas versões Católico Romanas), e esta pessoa não tinha certeza sobre onde encontrar o livro em sua Bíblia… triste ver tal condição em crentes com tanto tempo de igreja, mas muito mais triste é ver que em sua comunidade não existe um convincente programa de ensino bíblico.
A Bíblia mal é manuseada em cultos, sendo misturada com ensinos dos gurus da envenenada Teologia da Prosperidade. Servindo alimento assim, como que o rebanho poderá crescer na graça e no conhecimento? Como expôs Paulo Romeiro sobre o problema do método de ensino materialista das igrejas neopentecostais onde os líderes ensinam que “a vida do cristão deve ser livre de qualquer problema. Ele deve morar em mansões, possuir carros caros, ter muito dinheiro e muita saúde. Se isso não ocorrer, estará caracterizada a ausência de fé, a vida em pecado ou então o domínio de Satanás. Em outras palavras, a característica do cristão maduro é a plena saúde física e emocional, além da prosperidade material”. [2] Pergunto: que Evangelho é esse? Que ensino é esse?
Se os crentes seguissem o exemplo dos cristãos da cidade de Beréia, não teríamos tamanha farra espiritual e teológica. Os crentes de Beréia foram chamados de nobres, já que examinavam as escrituras para comprovar se os ensinos eram condizentes (At 17.11).
O exame bíblico: a importância do ministério de ensino
O ensino numa comunidade cristã pode ser realizado através de muitos meios, mas é na escola bíblica, um departamento exclusivo para este assunto, que o caminho para maturidade é aberto. A Bíblia Sagrada mostra como o ensino é importante e apresenta parâmetros para que o mandamento de Deus seja cumprido. Além disso, mostra que estar na escola é uma dádiva tanto ao aluno como ao professor.
O mandamento
O Antigo Testamento mostra a importância que o ensino tinha na vida daquele povo. Observamos que Moisés foi um grande professor da Palavra de Deus aos judeus (Dt 4.10; 6.7; 4.14; 4.5). Por conseqüência temos a característica de ensino dentro dos ministérios levítico e profético, passando pelas “Escolas de Profetas”. Após o exílio, um complexo sistema de ensino foi criado (Escolas de Sinagoga). A sociedade incorporou a necessidade ao ponto que até as crianças dedicavam muito tempo ao estudo da Palavra de Deus.
No contexto do Antigo Testamento, temos uma relação de homens usados por Deus para ensinar Seu povo:
– Samuel (1 Sm 12.23)
– Josafá (2 Cr 17.7-12)
– Esdras e Neemias (Ne 8.17)
– Davi (Sl 51.13 – Cf. Sl 25.4; 27.11)
– Isaías (Is 28.10)
Passando para o Novo Testamento, verificamos que a ênfase de Deus no ensino permanece com sua devida importância. Acima de qualquer pessoa que tenha passado pela Terra temos em Jesus Cristo o mestre por excelência. Jesus foi um exímio ensinador. É preciso resgatar esta essência urgentemente! Vejamos a forma que a Palavra narra esta característica tão peculiar de Jesus:
“E percorria Jesus toda a Galiléia, ensinando nas suas sinagogas e pregando o evangelho do reino, e curando todas as enfermidades e moléstias entre o povo.” Mateus 4.23
“Porquanto os ensinava como tendo autoridade; e não como os escribas”. Mateus 7.29
“Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque eu o sou.” João 13.13
“E Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e teve compaixão deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor; e começou a ensinar-lhes muitas coisas.” Marcos 6.34
Jesus implantou o sistema de ensino e os discípulos deram andamento em tal sistema. Paulo foi um grande mestre. Ele investiu no ensino, por exemplo, quando ficou em Antioquia por um ano deixando mestres preparados naquele lugar para poder partir com tranqüilidade (At 13.1); dedicou três anos em Éfeso e um ano e meio em Corinto (At 13.11). Ensinar e pregar eram vistos de modo distinto, traçando assim o perfil e definindo que os chamados pastorais e de mestre eram verdadeiramente separados (At 5.42; Ef 4.11). Isso nos leva a conclusão que o cristão comprometido com a Palavra precisa de mais tempo de estudo em casa e na Escola Bíblica, e não apenas se contentando com o texto exposto em dois ou três cultos semanais. É preciso mais!
As epístolas paulinas são grandes tratados de ensino e exposição do Evangelho, tanto que Paulo se torna um exemplo vivo de tal aplicação. Veja 2 Tm 1.11; 1 Tm 3.2; 2 Tm 2.2.
Infelizmente, a igreja hodierna não quer dar a devida atenção ao ensino. Um povo ensinado não pode ser manipulado com falsas promessas como as da Teologia da Prosperidade e das modas que a cada dia surgem nos arraias evangélicos. Leitor amado, olhe para sua igreja local, onde você congrega com seus irmãos em Cristo e reflita comigo: O que é importante? O que tem sido pregado? Riquezas ou o Evangelho de Cristo? O que tem sido ensinado? A Cruz? Existe um ministério de ensino bíblico? Pelo menos uma classe? Seu pastor se preocupa com isso? E você?
Como disse D.V. Hurst “poucas dúvidas pode haver quanto à importância do ministério de ensino. Durante o período da história bíblica, o ensinador ocupou posição estratégica na propagação da mensagem de Deus”. [3]
É urgente a necessidade de preparar a noiva de Cristo para Sua volta, e ensinar ao povo de Deus a sã doutrina é mais que necessário para que todos estejam firmes no Senhor e que nenhum se perca.
Conclusão
Concluindo esta segunda perna de nosso tripé, cito as sábias palavras de Wayne Grudem, ao descrever em sua Teologia Sistemática, os “Meios de Graça na Igreja”: “É justo apresentar o ensino da Palavra como primeiro e mais importante meio de graça dentro da igreja. Mas convém acrescentar que esse ensino abarca não só o ensino oficialmente reconhecido, ministrado pelo clero ordenado da igreja, mas também todo o ensino que ocorre nos estudos bíblicos, nas aulas das escolas dominicais, na leitura de livros cristãos sobre as Escrituras e mesmo no estudo pessoal da Bíblia”. [4]
No próximo artigo vamos concluir a análise deste tripé com a terceira perna, o defender. Vamos ver que apologética não é um bicho de sete cabeças nem um artefato de guerrilha, mas sim um meio para alcançar os perdidos. Vamos ver que a apologética é muito relevante para nossos dias. Até lá!
Toda honra e glória ao Senhor!
Notas:
[1] CHAMPLIN, Russel Norman. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. 8ª Ed. Vol II. Hagnos. São Paulo, SP: 2006. p.390
[2] ROMEIRO, Paulo. Decepcionados com a Graça. Mundo Cristão. São Paulo, SP: 2005. p.98
[3] HURST, D.V. E Ele concedeu uns para mestres. Editora Vida. São Paulo, SP: 1991. p.10
[4] GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. Vida Nova. São Paulo, SP: 2003. p. 804
Fonte: NAPEC