“Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus” (Romanos 3.23-24)
O homem certamente foi engolfado pelo pecado a partir da queda. O pecado passou a ser uma marca indelével no seu caráter quando o homem deixou de gozar do beneplácito divino, após a queda do casal primevo, narrada no capítulo terceiro do livro de Gênesis.
Tão logo foi cometido o pecado, com a queda propriamente dita, Deus passou a olhar a sua criação com olhos críticos. O pecado teve a força de subverter tudo, tornando disforme e depravada não somente a imagem do homem (feito à imagem e semelhança de Deus), como toda a criação, a totalidade do universo criado. Como que fora disseminada uma sombra, uma cortina escura sobre o universo, absorvendo dele todas “as cores”, toda a pujança de outrora. É de se imaginar que o Criador passou a ver o que criara, inicialmente tão bom e belo, com uma sombra a deformar tudo.
O homem não mais conseguia buscar a Deus; o seu Senhor e Criador ficou separado das suas criaturas, uma vez que, sendo santo e justíssimo, não poderia misturar-se a seres pecaminosos e impuros. O pecado, pois, infligiu ao homem a solidão de Deus. Não havia mais como buscá-Lo (Salmos 14.1-3, 51.5-6; Romanos 3.10-12), pois a justiça do homem transformara-se em “trapos de imundície” (Isaías 64.6).
Pelo pecado de um só homem, toda a humanidade pecou e tornou-se carecedora de Deus (Romanos 5.12). Não há obra humana capaz de novamente religar o homem a Deus, a não ser o próprio Deus. Toda a humanidade padece o seu próprio mal; o planeta e o universo gemem pela distância do Criador, pela sua ausência. Os “mortos” continuam nas suas atividades normais, o tempo flui o seu lapso contínuo, mas o homem – morto em seus delitos e pecados – cada vez mais se aprofunda no erro. Não há quem busque a Deus, não há um sequer.
É preciso que o pecado se desvaneça para que o homem, o universo inteiro, possa voltar a Deus. O que fazer, se o próprio homem, vestido de uma natureza completamente pecaminosa não se vê em condição de buscar o Criador? Como religar o que foi rompido? Como restabelecer a antiga imagem e semelhança de Deus ao homem sem a deformação imposta pelo pecado e pelo mal?
Ora, se ao homem é impossível a tarefa de novamente estar em relacionamento com o seu Criador, cabe somente ao próprio Deus, segundo a sua vontade e desígnio eternos, trazer o homem para Ele (João 15.16).
Aprouve então a Deus dar o seu unigênito Filho (Joaõ 3.16) para resgatar essa humanidade perdida, trazendo para si todos aqueles que creem, pelo Seu exclusivo amor. Ato unilateral de vontade! E assim, pela obediência de um só homem (Cristo), muitos foram justificados (Romanos 5.19).
Há os que dizem que, a despeito da queda o homem ainda pode buscar a Deus, através de uma força chamada livre arbítrio. As Escrituras dizem que não, uma vez que a depravação foi total: não há quem busque a Deus, pois todos pecaram e carecem de sua glória – através do pecado de um só homem.
Fé. Somente a fé pode novamente religar o homem ao Seu Criador. Não podemos tê-la por nossas próprias forças. Temos um caráter depravado. Não auxiliamos Deus nesse mister. Como tê-la então? Uns dizem que é possível ter fé, a despeito do pecado original, muito embora a Palavra diga que não. Argumentam que a fé produz a regeneração, e que esta fé é fruto de um certo livre arbítrio. Assim, segundo eles, o buscar a Deus é dom do próprio homem. Todavia, a Palavra de Deus diz o contrário:
“Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia” (João 6.44);
“Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum lançarei fora” (João 6.37);
“E prosseguiu: por causa disto, é que vos tenho dito: ninguém poderá vir a mim se, pelo Pai, não lhe for concedido” (João 6.65).
Em outras palavras, o evangelista está dizendo que o homem não pode buscar a Deus. E, buscar a Deus, nesse contexto bíblico, é ter fé! Ou seja, Deus nos concede a fé para que possamos buscá-Lo, uma vez que o homem não pode fazê-lo por si mesmo. O contexto bíblico é claro, remansoso, cristalino, irrefutável. Logo, a regeneração precede a fé e esta vem pelo ouvir a Palavra. E essa fé, não vinda do homem, é dom gratuito de Deus (Efésios 2.8-9). A fé, pois, é presente, dádiva de Deus.
O homem coopera com Deus de alguma forma no caminho a percorrer para ter fé? Segundo o que diz a Bíblia (sic) não. Homens mortos em seus delitos e pecados não têm como buscar a Deus, tampouco cooperar com Ele em qualquer coisa. E eis que, por isso mesmo, “Deus é quem efetua em nós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade (Filipenses 2.13).
Finalmente, como Deus opera esse querer e realizar em nós, homens mortos em nossos delitos e pecados? Devemos buscar a resposta na própria Bíblia, então vejamos:
“Assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado, no qual temos a redenção, pelo seu sangue, a remissão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça” (Efésios 1.4-7);
“Nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade” (Efésios 1.11);
“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados” (Efésios 2.1)
Erram aqueles que dizem, a despeito da própria Bíblia, que fazemos a escolha (fé) através de um certo livre arbítrio, completamente contrário à lógica escriturística colacionada em epígrafe. Ele nos escolheu antes que nós o escolhêssemos (João 15.16), valendo dizer que apenas O escolhemos depois que Ele nos escolhe. E como é feita essa escolha? Por ato exclusivo da vontade do Criador (eleição), através de critérios tais que somente Ele tem conhecimento:
“Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes a imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou” (Romanos 8.29-30).
E de quem é a fé? Porventura é de todos? Não, mas somente daqueles que foram escolhidos por Deus na eternidade (2 Tessalonissenses 3.2; Tito 1.1).
Deus é injusto por eleger alguns e reprovar outros? Não, pois Ele, sendo Deus, tem misericórdia e compaixão de quem quer ter (Romanos 9.14-15). E então, por acaso, depende de quem corre (livre arbítrio)? Não, mas de usar Deus a sua misericórdia (Romanos 9.16).
Deus é o Oleiro, nós somos apenas barro. E o Oleiro faz do barro o que lhe apetece. Faz vasos agradáveis e vasos desagradáveis, exatamente a fim de que sejam diferenciados os bons dos maus, para a honra da sua glória.